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Comer e sofrerTudo muda na adolescência. Muda o corpo, mudam as relações e os afectos, os interesses e os gostos. E neste turbilhão de mudanças os adolescentes são permeáveis a influências múltiplas, das geradas no seio do grupo a que se esforçam por pertencer às veiculadas pelos estereótipos de uma sociedade que cultiva a imagem como uma verdadeira ditadura.
Ser magro é quase um imperativo. Mas, numa altura em que o corpo ganha novos contornos, a caminho da feminilidade e da masculinidade, facilmente se cai na obsessão de perder quilos que não se têm a mais.
É comum entre os adolescentes uma imagem distorcida de si próprios que os faz mergulhar em comportamentos extremos, em que pontuam os distúrbios alimentares. São distúrbios quase sempre no feminino, porventura porque as raparigas são mais permeáveis às pressões sociais e culturais. O que não significa que os rapazes passem pela adolescência sem perturbações do foro alimentar - calcula-se que dez por cento também se deixam cair nas malhas da anorexia e bulimia.
A rejeição dos alimentos
Um medo intenso de engordar é o que sentem os adolescentes que sofrem de anorexia nervosa, um distúrbio alimentar caracterizado pela rejeição dos alimentos. Aos seus olhos o espelho devolve sempre uma imagem demasiado gorda, ainda que a balança indique o contrário. Desenvolvem então uma relação obsessiva com a comida, pesando ao grama o pouco que comem e contando até à exaustão as calorias.
Assim, acontece sobretudo com as raparigas, com um contexto que as torna particularmente vulneráveis: baixa auto-estima, alguns traços obsessivos, falta de confiança acerca do seu valor pessoal mas, paradoxalmente, padrões elevados de exigência e responsabilidade. A insegurança alimenta uma dificuldade visível em relacionarem-se com os outros. Em comum têm igualmente uma sensação de que não conseguem gerir a sua própria vida, de que são incapazes de tomar decisões, de que não conseguem atingir a perfeição - concentram-se, então, no corpo, procurando através dele o controlo que pensam ter-lhes escapado e, com ele, uma forma de se valorizarem. (...)
Cada quilo perdido é encarado como uma vitória pessoal. Mas uma vitória que lhes fragiliza a saúde e ameaça mesmo a vida. Quando os quilos perdidos perdidos correspondem a 15 ou 20% do peso normal, os danos podem ser devastadores - pode não haver gordura corporal suficiente para manter os orgãos saudáveis. Orgãos como o coração, o fígado e os rins podem deixar de funcionar normalmente se a pessoa não comer o suficiente. O metabolismo corporal desacelera, causando quebras na pressão sanguínea, no ritmo cardíaco e nos movimentos respiratórios.
A falta de energia instala-se, a dificuldade de concentração também. A anemia é frequente, nas raparigas o período menstrual cessa. O cabelo pode cair, as unhas ficam mais quebradiças.
Nos casos mais severos, a anorexia pode conduzir a um cenário de desnutrição e até morte.
Todavia, quando confrontadas com o emagrecimento excessivo, as jovens tendem a negar, recusam receber ajuda, entrando muitas vezes em conflito com os familiares. A anorexia causa igualmente danos emocionais - a obsessão com o peso impede que se concentrem em qualquer outra coisa, abrindo caminho ao isolamento, mas também potenciando sentimentos de culpa e depressão. »